Inteligência Artificial na Advocacia: Potência com Responsabilidade
Por Juliana Cecconi, gestora e Manuella Martins, coordenadora de marketing
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09/06/2025 17h26
Nos últimos anos, a inteligência artificial (IA) ganhou protagonismo no setor jurídico, impulsionada por avanços significativos em modelos de linguagem e automação. Escritórios de advocacia têm explorado essas tecnologias para otimizar pesquisas jurisprudenciais, agilizar a redação de documentos e facilitar o acompanhamento de prazos. No entanto, junto às promessas de eficiência e inovação, surgem também desafios relevantes.
IA é ferramenta, não substituto do raciocínio jurídico
Antes de tudo, é essencial esclarecer um equívoco comum: a IA não representa ameaça à advocacia, tampouco substitui o conhecimento técnico, a experiência e o julgamento crítico do profissional do Direito. Trata-se de uma ferramenta de apoio — assim como um motor de busca não dispensa a análise das fontes primárias, a IA não exime o advogado da responsabilidade sobre a veracidade e a precisão das informações utilizadas.
A incorporação da IA ao fluxo de trabalho jurídico requer protocolos rigorosos de verificação. Toda jurisprudência ou doutrina sugerida por ferramentas tecnológicas deve ser conferida em fontes oficiais. Isso reforça a cultura da checagem, da responsabilidade técnica e da ética na atuação profissional.
Infelizmente, já foram noticiados casos de uso irresponsável da IA, especialmente em razão das chamadas alucinações jurídicas. O termo técnico refere-se a respostas inventadas ou imprecisas fornecidas por sistemas de IA — como menções a jurisprudências inexistentes, dispositivos legais incorretos ou julgados fictícios com aparência verossímil. Em alguns episódios, advogados chegaram a apresentar petições com decisões judiciais falsas, gerando constrangimentos, sanções e questionamentos sérios sobre o uso indiscriminado da tecnologia.
Apesar dessas limitações, a IA possui grande potencial de apoio à prática jurídica. Pode ser utilizada com segurança para sugerir estruturas de texto, uniformizar a linguagem técnica e otimizar rotinas administrativas. Também é útil na organização de grandes volumes de informação e na geração de insights preliminares.
Contudo, o uso consciente da IA exige formação adequada, senso crítico e governança institucional. Escritórios que desejam explorar esse potencial de forma ética e eficaz devem capacitar suas equipes, instituir comitês de tecnologia e estabelecer diretrizes claras para o uso da ferramenta.
A inteligência artificial pode transformar positivamente a advocacia — desde que utilizada com a sobriedade que o Direito exige. Mais do que uma tendência, trata-se de uma mudança estrutural. E, como toda tecnologia poderosa, ela demanda supervisão humana, responsabilidade e, sobretudo, compromisso com a verdade e com a excelência técnica. Ao final, o valor da advocacia continuará residindo na capacidade humana de interpretar, argumentar e decidir — com rigor, prudência e integridade. Mas garantir rigor não basta; é preciso que essa eficiência seja percebida pelos clientes.
Da eficiência interna ao valor percebido
Quando falamos em protocolos de verificação, governança e revisão humana, pontos centrais da discussão técnica, surge um segundo desafio: mostrar ao cliente onde essa inovação se transforma em vantagem concreta. A automação já assume tarefas repetitivas — selecionar precedentes, resumir autos volumosos, preparar rascunhos iniciais — liberando a equipe para o que realmente importa: analisar o contexto do negócio, desenhar a estratégia processual e antecipar riscos. Ainda assim, o mercado opera, em grande parte, com modelos de cobrança por hora que não refletem essa redistribuição de esforços, e seguimos avançando na construção de métricas capazes de demonstrar, em tempo poupado e custos evitados, o valor real dessa transformação.
É justamente aqui que o Marketing entra como ponte, não como vitrine. Seu papel é escolher métricas que façam sentido para quem está do outro lado da mesa, traduzir resultados técnicos em argumentos de negócio e manter um fluxo contínuo de transparência. Quando apresentamos, em linguagem simples, quanto tempo foi economizado e como a exposição ao risco diminuiu, a IA deixa de parecer um recurso opaco e passa a ser vista como parceira estratégica. Relatórios visuais, conversas periódicas e dashboards compartilhados tornam-se, então, instrumentos de confiança mútua.
Nosso desafio coletivo, portanto, não é provar que a IA funciona, mas demonstrar quando ela faz diferença, quanto dessa diferença é material para o cliente e como mantemos a confiabilidade do processo. Ao colocar transparência e mensuração no mesmo nível da inovação, transformamos um tema potencialmente controverso em espaço legítimo de parceria. Assim reforçamos que, no Direito, tecnologia só é potência quando serve à responsabilidade.