Informativo Trabalhista

Boas práticas e desafios no gerenciamento do contencioso de volume 

O gerenciamento do contencioso de volume figura entre os maiores desafios dos departamentos jurídicos empresariais. Não se trata apenas de lidar com um número expressivo de processos, mas de garantir que cada um deles seja conduzido com estratégia, coerência e alinhamento aos objetivos do negócio.

Por Vanessa Leite de Souza Katayama

[email protected]

13/05/2025 13h29

Frente a demandas frequentemente pautadas em temas recorrentes, torna-se inviável adotar uma postura meramente reativa. Exige‑se atuação metodológica, amparada por inteligência jurídica e sensibilidade para liderar pessoas em ambiente de alta pressão e complexidade.

Na prática, o primeiro passo é reconhecer que grande parte das ações judiciais segue padrões recorrentes. Com o tempo, é possível observar que grande parte das ações judiciais segue roteiros similares, com variações de acordo com a localidade ou o segmento de atuação da empresa.

Diante desse cenário, recomenda‑se a padronização de teses e peças processuais, sempre respeitando particularidades regionais e setoriais. A uniformização reduz o tempo de resposta às intimações, confere coesão argumentativa e fortalece a imagem institucional perante o Judiciário.

A jurisprudência, em especial a do Tribunal Superior do Trabalho, deve ser monitorada de forma contínua. A cada atualização relevante, realiza‑se reunião de revisão para adequar teses e garantir aderência aos princípios da segurança jurídica e da previsibilidade, atributos progressivamente valorizados pelo meio corporativo.

A tecnologia ocupa papel central nesse contexto. Ferramentas de acompanhamento processual, painéis de indicadores e soluções de jurimetria convertem grandes volumes de informações em insumos estratégicos para a tomada de decisões. Tais instrumentos, contudo, não suplantam a análise crítica e o discernimento humano.

No entanto, é imprescindível destacar que tais instrumentos, por mais sofisticados que sejam, não substituem a análise crítica e o discernimento humano. A análise jurídica exige interpretação contextualizada, conhecimento profundo do negócio e sensibilidade para compreender as nuances de cada caso. Já vivenciamos situações em que a leitura fria dos dados sugeria uma tese defensiva, mas a escuta ativa do cliente e a análise do histórico do reclamante indicavam que o melhor caminho era a composição. Essa capacidade de equilibrar dados e contexto é, a meu ver, uma das competências mais valiosas da advocacia corporativa contemporânea. 

Outro ponto que considero absolutamente estratégico, e que muitas vezes é negligenciado, é a gestão das equipes envolvidas na condução do contencioso. Atribuir a profissionais ou times específicos a responsabilidade por carteiras volumosas de processos exige mais do que domínio técnico; demanda engajamento contínuo, sobretudo em atividades cuja rotina tende à repetição.

Ao longe desses anos frente à coordenação de carteira trabalhista de volume, a experiência me mostrou que a motivação e a produtividade estão diretamente relacionadas a um ambiente de valorização profissional, com oferta regular de capacitações, canais abertos para escuta ativa e incentivo ao senso de propósito. A gestão de pessoas, nesse contexto, torna-se uma competência paralela e, muitas vezes, mais desafiadora do que a própria atividade jurídica. 

Além disso, a qualidade das informações inseridas nos sistemas corporativos revela-se um fator crítico de sucesso. A precisão no registro dos dados, especialmente aqueles voltados ao contingenciamento, impacta diretamente na credibilidade do departamento jurídico e na efetividade das decisões estratégicas. Não são raros os casos em que falhas pontuais no cadastro de processos ocasionam distorções relevantes nas análises de risco ou mesmo nos provisionamentos.

Por isso, reforçamos constantemente junto às equipes a importância da acurácia na alimentação dos sistemas, mesmo quando se trata de dados aparentemente simples. A base de dados é o alicerce da jurimetria e da análise preditiva e, sem ela, qualquer estratégia perde sustentação. 

Outro fator essencial para o sucesso na condução de uma carteira de contencioso de volume é a capacidade de conseguir uma profunda integração com o cliente e com as demais áreas da organização. O jurídico corporativo deve atuar como elo entre os diferentes setores, contribuindo não apenas na esfera contenciosa, mas também de forma preventiva.

Ainda assim, a organização, por si só, não elimina todos os entraves. O volume elevado de processos pode restringir o aprofundamento técnico em cada caso, e a oscilação jurisprudencial impõe atualização contínua e flexibilidade na revisão de estratégias. Discernimento para identificar o momento apropriado de sustentar determinada tese ou buscar solução conciliatória é essencial. Acordos estratégicos, quando bem calibrados, produzem economias financeiras relevantes e ganhos reputacionais junto ao Poder Judiciário.

A liderança jurídica, portanto, posiciona‑se como ponte entre estratégia e execução, entre dados e pessoas, entre técnica e cultura organizacional. O êxito na gestão do contencioso de volume resulta da somatória de atuação técnica consistente, uso estratégico de dados, integração efetiva com o negócio e liderança sensível aos objetivos corporativos.

Quando esses elementos se alinham, o jurídico transcende a condição de departamento de suporte e converte‑se em agente de transformação organizacional. Transformar complexidade em clareza, volume em estratégia e pressão em oportunidades de crescimento é compromisso permanente, que exige resiliência, inovação e propósito. O impacto positivo de uma gestão estruturada manifesta‑se na mitigação de riscos, no fortalecimento da confiança interna e no desenvolvimento das pessoas envolvidas. Mais do que coordenar processos, trata‑se de cuidar de pessoas e tomar decisões informadas, com consciência e propósito.

É nesse ponto que percebo o real papel da liderança jurídica, ser ponte entre a estratégia e a execução, entre os dados e as pessoas, entre a técnica e a cultura da empresa. Embora a caminhada seja desafiadora, é também extremamente enriquecedora. Cada obstáculo enfrentado representa uma oportunidade de aprimoramento profissional e humano e, sobretudo, a chance de construir um jurídico mais forte, coeso e relevante dentro da organização. A experiência me mostrou que o êxito na gestão do contencioso de volume reside na combinação de atuação técnica consistente, uso estratégico de dados, integração efetiva com o negócio e, acima de tudo, liderança sensível e comprometida com as pessoas e com os resultados. 

Quando conseguimos alinhar esses elementos, o jurídico deixa de ser apenas um departamento e passa a ser um agente de transformação dentro da organização. E é com essa convicção que sigo liderando, aprendendo e construindo um jurídico cada vez mais forte, relevante e conectado com os objetivos dos clientes. 

Ser coordenadora de um contencioso trabalhista de volume é assumir a responsabilidade de transformar complexidade em clareza, volume em estratégia e pressão em oportunidades de crescimento. É liderar com propósito, buscando não apenas resultados, mas também o desenvolvimento da equipe, a construção de relações sólidas com parceiros e a promoção de uma atuação jurídica mais humana e eficiente. Os desafios são muitos, desde a gestão de riscos até a adaptação constante às mudanças do cenário jurídico, mas é justamente neles que se revela a força da liderança, na capacidade de inspirar, de inovar e de fazer a diferença todos os dias, mesmo diante da rotina mais intensa.

Apesar dos desafios, é gratificante perceber o impacto positivo que uma boa gestão pode gerar, seja na prevenção de riscos, na construção de um ambiente de confiança ou no desenvolvimento das pessoas. No fim do dia, mais do que coordenar processos, é sobre cuidar de gente e fazer escolhas com consciência e propósito.

Veja todas as notícias