A Efetividade da execução e os mecanismos de Investigação Patrimonial
A efetividade da execução judicial depende, em grande parte, da capacidade de localizar bens penhoráveis dos devedores, o que exige uma atuação estratégica e atualizada frente às possibilidades existentes.
Dentre os meios mais comumente utilizados na prática, destacam-se os sistemas SISBAJUD, RENAJUD, INFOJUD e SERASAJUD. Esses sistemas permitem, respectivamente, o bloqueio de valores em instituições financeiras, a verificação de veículos em nome do executado, o acesso a declarações fiscais e a inserção de informações em órgãos de proteção ao crédito.
No entanto, apesar de sua utilidade, essas ferramentas vêm se mostrando insuficientes frente ao comportamento cada vez mais elaborado dos chamados “devedores profissionais”.
Esses devedores, ao tomarem consciência da impossibilidade de adimplir suas obrigações financeiras, recorrem a estratégias que dificultam ou impedem a localização de bens, como a transferência de valores para terceiros, alienações fraudulentas, uso de laranjas, ocultação de patrimônio em nome de cônjuges ou parentes, entre outras condutas.
Nessas situações, a simples inclusão do nome do devedor em cadastros de inadimplentes, por meio do SERASAJUD, revela-se inócua, sobretudo quando ele já possui restrições anteriores.
O uso do INFOJUD também precisa ser ampliado e qualificado. É comum que os pedidos se limitem à declaração de imposto de renda do executado, mas esse documento, por se basear em informações prestadas pelo próprio contribuinte devedor, pode ser incompleto ou até mesmo manipulado.
Assim, é necessário explorar dados prestados por terceiros, como ocorre na solicitação de informações via DOI (Declaração sobre Operações Imobiliárias), em que os cartórios informam à Receita Federal as transações realizadas, possibilitando a descoberta de imóveis adquiridos ou vendidos, ainda que omitidos na declaração de renda.
Essa declaração é uma obrigação acessória exigida pela Receita Federal, que tem como objetivo informar as operações de compra e venda de imóveis realizadas por pessoas físicas ou jurídicas. Ela é essencial para que o Fisco possa cruzar dados e combater a sonegação fiscal, identificando eventuais omissões de receita ou ganhos de capital não declarados. Além disso, a DOI permite ao governo monitorar o mercado imobiliário e conferir mais transparência às transações realizadas. Dessa forma, mesmo que o devedor não declare a venda ou compra de imóveis, é possível tomar conhecimento das transações realizadas.
Também, existem outros dispositivos de buscas disponíveis, entre eles, destacam-se a penhora de recebíveis oriundos de maquininhas de cartão, bastante eficaz no caso de empresas devedoras; a consulta à ARISP, que permite rastrear imóveis registrados em cartórios do Estado de São Paulo; e a expedição de mandado de constatação, medida útil para verificar in loco a real situação financeira do devedor.
Também se mostra valiosa a busca de créditos que o devedor possa ter junto a terceiros, como honorários, aluguéis ou valores decorrentes de prestação de serviços. Outras possibilidades incluem a verificação de créditos acumulados na Nota Fiscal Paulista, o rastreamento de ativos em criptomoedas e a consulta à SUSEP e CNSEG, que permitem descobrir seguros, previdência privada e valores decorrentes de indenizações securitárias.
Além disso, sistemas como o INFOPEN possibilitam localizar penhoras já existentes sobre bens de empresas, enquanto diligências realizadas por oficiais de justiça podem revelar bens físicos ocultos. A consulta à CNIB é essencial para identificar indisponibilidades sobre imóveis, e o acesso ao CCS/BACEN permite saber em quais instituições financeiras o devedor possui conta, mesmo que o saldo não seja revelado ou que o devedor não seja titular exclusivo, como contas conjuntas, contas de empresas das quais o devedor é sócio ou representante legal ou contas em que o dever é procurador, autorizado ou representante/responsável legal. Já a plataforma CENSEC revela a existência de testamentos, procurações e escrituras que envolvam o executado, dando poderes para movimentar valores em nome de terceiros.
Importante destacar, ainda, que a ocultação patrimonial por meio da inclusão de bens em nome de cônjuges não devedores exige medidas específicas, como a desconsideração da personalidade jurídica ou o reconhecimento da fraude à execução. O inverso também pode ocorrer. Imagine-se a situação de um devedor profissional que constitui uma holding sob o pretexto de administrar seu patrimônio e transfere para ela todos os seus bens.
As pesquisas de bens em nome desse devedor, naturalmente, resultariam negativas. Embora a constituição da holding, por si só, não seja ilegal, o ato pode assumir caráter ilícito quando utilizado com a finalidade de ocultar patrimônio e frustrar a efetividade da execução. Nessas hipóteses, é cabível a desconsideração inversa da personalidade jurídica, permitindo que os bens da pessoa jurídica sejam alcançados para a satisfação da dívida do sócio devedor.
Há, ainda, ativos financeiros não abrangidos pelo SISBAJUD, como cotas de consórcios, títulos de capitalização e recebíveis de cartão, os quais podem ser acessados por ofícios às respectivas administradoras.
Por fim, vale mencionar a DIMOB, que revela atividades imobiliárias fora do registro em cartório, e a E-Financeira, uma das mais completas ferramentas de rastreamento patrimonial atualmente. Ela permite o acesso a dados sobre movimentações financeiras, aplicações, operações de câmbio, consórcios, planos de previdência privada, entre outros, com nível de detalhamento suficiente para formar um panorama completo do patrimônio do devedor.
Diante de tantas possibilidades, é imprescindível a utilização das ferramentas disponíveis de forma inteligente, articulada e estratégica, a fim de garantir o êxito da execução e, sobretudo, a efetividade da prestação jurisdicional. A atuação proativa na pesquisa patrimonial é, hoje, não apenas uma vantagem competitiva, mas uma necessidade diante da crescente sofisticação das tentativas de ocultação de bens.
RESUMO
Com base nos apontamentos acima, atualmente temos os seguintes meios de localização de bens dos devedores:
1. Sistemas Eletrônicos:
- SISBAJUD: Bloqueio de valores em instituições financeiras.
- RENAJUD: Verificação de veículos em nome do devedor.
- INFOJUD: Acesso a declarações fiscais (com limitações devido à possível manipulação).
- SERASAJUD: Inclusão do devedor em cadastros de inadimplentes (pouco efetivo para “devedores profissionais”).
2. Ferramentas Complementares:
- DOI (Declaração sobre Operações Imobiliárias): Identifica transações imobiliárias não declaradas, via dados de cartórios.
- Penhora de Recebíveis: Efetiva para empresas, como valores de maquininhas de cartão.
- Consulta à ARISP: Rastreia imóveis registrados em cartórios de São Paulo.
- Mandado de Constatação: Verificação “in loco” da situação financeira do devedor.
3. Créditos e Ativos Diversos:
- Créditos junto a terceiros (honorários, aluguéis, etc.).
- Rastreamento de criptomoedas, seguros (via SUSEP e CNSEG), e previdência privada.
- Consulta à CNIB para indisponibilidades de imóveis e ao CCS/BACEN para contas bancárias (incluindo contas conjuntas ou de empresas vinculadas).
4. Outros Mecanismos:
- INFOPEN: Localiza penhoras sobre bens de empresas.
- CENSEC: Revela testamentos, procurações e escrituras envolvendo o devedor.
- DIMOB: Identifica atividades imobiliárias não registradas em cartório.
- E-Financeira: Acesso detalhado a movimentações financeiras, aplicações, operações de câmbio, entre outros.
5. Medidas Jurídicas Especiais:
- Desconsideração da personalidade jurídica ou reconhecimento de fraude à execução para bens ocultados em nome de terceiros ou holdings.
CONCLUSÃO
A efetividade da execução judicial depende da utilização estratégica e articulada dessas ferramentas, especialmente diante da crescente sofisticação dos devedores. A combinação de sistemas eletrônicos, diligências presenciais e consultas a bases de dados específicas é essencial para garantir a localização de bens e a satisfação das obrigações.