Dever de segurança das Instituições financeiras perante as vítimas de estelionato e outras fraudes
Cada vez mais vemos nos noticiários casos de pessoas que foram vítimas de estelionato e outras fraudes envolvendo transferências bancárias, empréstimos, compras no cartão de crédito entre outras.
As vítimas de tais golpes, em sua grande maioria, buscam na justiça a reparação pelos danos ocasionados. Diante disso, questiona-se: Qual a responsabilidade das instituições financeiras perante essas pessoas?
Inicialmente, têm-se que a relação contratual firmada entre a instituição financeira e o titular da conta bancária é de natureza consumerista, aplicando-se o Código de defesa do Consumidor, conforme Súmula 297, do Superior Tribunal de Justiça: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.
A segurança é um direito básico do Consumidor, previsto no Artigo 6º, inciso I: “São direitos básicos do consumidor: I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos.”
Além disso, esse mesmo diploma legal estabelece, entre outros princípios, o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor (artigo 4º, inciso I, CDC) perante o fornecedor.
Assim, quando o fornecedor introduz um bem ou um serviço no mercado, espera-se que tal bem ou serviço seja confiável e seguro aos consumidores que o utilizarão, sendo responsável pela reparação de danos causados por defeitos na prestação do serviço, bem como por informações insuficientes e inadequadas, independentemente da existência de culpa. Responsabilidade dita objetiva (Artigo 14, CDC).
Com o avanço da tecnologia e desenvolvimento de sistemas eletrônicos, houve (e há) a ampla disponibilização e utilização de operações bancárias por meios tecnológicos, que, se espera, que as fornecedoras garantam a segurança dessas transações.
Os bancos se beneficiam com os meios de relacionamento eletrônico, com a consequente diminuição da contratação de funcionários e locais físicos para atendimento de clientes, por exemplo. Em contrapartida também se sujeitam aos riscos de fraudes eletrônicas. Desse modo, devem reforçar a segurança aos consumidores que utilizam tais serviços.
Nos termos do Artigo 14, § 1°, do CDC, o serviço é considerado defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração circunstâncias relevantes, como o modo de seu fornecimento, o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam, e a época em que foi fornecido.
A responsabilidade objetiva das instituições financeiras (independente de culpa) advém do risco próprio da atividade exercida pela instituição financeira. Todo modelo de negócio possui riscos. Se a instituição oferta um serviço que chama a atenção pela praticidade, como forma de atrair clientes, simplificando as burocracias bancárias, que em muito dificultavam as fraudes, sem dúvida assumem os riscos que envolvem tal oferta.
Em julgado proferido pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, em 12/09/2023, REsp 2.052.228/DF, a Ministra Nancy Andrighi, no relatório consignou que “é dever da instituição financeira verificar a regularidade e a idoneidade das transações realizadas pelos consumidores, desenvolvendo mecanismos capazes de dificultar fraudes perpetradas por terceiros, independentemente de qualquer ato dos consumidores.”
Nesse mesmo julgado a Ministra consigna que “é dever da instituição financeira desenvolver mecanismos de segurança que identifiquem e obstem movimentações que destoam do perfil do consumidor, notadamente em relação a valores, frequência e objeto. Nesse sentido, a ausência de procedimentos de verificação e aprovação para transações que aparentem ilegalidade corresponde a defeito na prestação de serviço, capaz de gerar a responsabilidade objetiva por parte do banco.”
Como consignado pela Ministra, a aprovação de transações que aparentam ilegalidade, por serem totalmente atípicas em relação ao padrão de consumo daquele consumidor, corresponde a defeito na prestação de serviço, respondendo pelo risco da atividade, pois a instituição financeira precisa se precaver a fim de evitar golpes desta natureza – cada vez mais frequentes no país.
Assim, mesmo quando a fraude é praticada por terceiros, a depender do caso, pode-se reconhecer o dever de a instituição financeira indenizar o consumidor pela falha na prestação do serviço por falha na segurança, com aplicação da teoria do risco do empreendimento.
Nesses casos, a recomendação é que a vítima entre em contato com a instituição financeira para informar a fraude e contestar eventuais valores, anotando número de protocolo. Deve, também, registar o boletim de ocorrência na delegacia de polícia física ou virtual.
Não sendo resolvido de forma consensual diretamente com a instituição financeira, importante buscar assessoria jurídica para melhor análise e, se o caso, levar a questão ao judiciário. Convém ressaltar que, independentemente da responsabilidade objetiva da instituição financeira, tal condição não retira do consumidor a obrigação de cercar-se de todos os cuidados necessários ao utilizar os serviços bancários, seja através de aplicativos, bancos eletrônicos ou agências bancárias.